Entusiasmada com a música que
ouve, uma garota aparentando 15 anos subitamente se ergue da cadeira do teatro,
começa a correr e, sem que os seguranças consigam detê-la, pula no palco e
beija um dos músicos. Uma cena até certo ponto comum no universo do rock, mas
com certeza inusitada na música erudita, mesmo se considerarmos que o músico
beijado faz parte da Orquestra de Violoncelistas da Amazônia, cujas performances
atuais lembram muito a de bandas de rock. O mais incrível, porém, é que a cena
aconteceu num país de tradições tão rígidas como a China, onde a Orquestra se
apresentou em agosto de 2010, como único grupo brasileiro selecionado para a 29ª
Conferência da Sociedade Internacional de Educação Musical (ISME), em Pequim.
Foto: Renato Reis
Ao embarcar para a China, o grupo
ainda se chamava Orquestra Juvenil de Violoncelistas da Amazônia. No retorno a
Belém, o maestro Áureo de Freitas retirou o termo “Juvenil” do nome, por
entender que o adjetivo estava soando pejorativamente e vinha prejudicando os
convites para apresentações. Por motivos idênticos, a palavra “Infanto” já
saíra do nome há algum tempo – o grupo se chamava Orquestra Infanto-Juvenil de
Violoncelistas da Amazônia, quando foi criado, em 1998, em conseqüência do
sucesso do 1º Encontro de Violoncelistas da Amazônia, por sua vez um resultado
direto do desempenho apresentado pelos alunos do projeto Violoncelo em Grupo,
também implementado em 1998 na UFPA, onde Áureo é professor efetivo de
violoncelo desde 1994.
Na época, o repertório da
Orquestra era formado por clássicos de autores como Bach, Villa-Lobos e Saint-Saëns. O
desempenho dos jovens músicos paraenses gerou convites para três turnês no Rio
de Janeiro (2000, 2001 e 2004), Estados Unidos (2002) e Holanda (2004) e para a
gravação de dois programas de rádio e um de TV para a BBC.
A ligação mais forte com o rock
se deu a partir de 2007, quando Áureo foi convidado a escrever o arranjo de
“Kashmir”, do Led Zeppelin, para que a Orquestra o interpretasse ao lado de
Jimmy Page em Londres (o que acabou não se concretizando) e também por uma
vontade dos próprios músicos (Áureo permite aos alunos escolher o que querem
tocar, e foi essa “terceira geração” que pela primeira vez apontou o rock como
uma preferência). O público de Belém pôde conhecer esta nova fase no concerto
realizado no Theatro da Paz em novembro de 2007, em que a Orquestra teve como
convidados a banda Madame Saatan e os cantores Edmar Rocha (do Mosaico de
Ravena), Márcia Aliverti e Juliana Sinimbú: “Teve garoto se jogando no chão,
violoncelista colocando violoncelo na cabeça... foi aí que realmente a nossa
vida foi transformada”, recorda Áureo.
Outro momento marcante foi a
participação da Orquestra no Conexão Vivo Belém, em junho de 2010. O grupo foi
o único representante do Norte a chegar ao evento por votação popular na
internet – foram 1106 votos recebidos, atrás apenas de três bandas de música
popular do Sudeste. Apesar disso, o que aconteceu surpreendeu muito o maestro:
“Nunca imaginei a gente tocar pra 15 mil pessoas, fãs gritando, assédio... aquilo
foi demais! Depois do concerto com Madame Saatan, esse foi o ponto mais alto da
nossa carreira”.
Para a continuidade da carreira,
os planos incluem a gravação do primeiro CD ao vivo em 2011 e uma turnê pela
Grécia em 2012.
- Making-off do texto - Escrito em 21.11.10 para o Pará Música, com o título Orquestra de Violoncelistas da Amazônia.